terça-feira, 11 de dezembro de 2007

A ARTE DO OFÍCIO (OU O OFÍCIO DA ARTE)


Falar sobre educação no Brasil é assunto que rende e não caberia em um post despretensioso. Que o sistema educacional, principalmente o público, está cada vez pior, isto é fato e pode ser comprovado por diversas pesquisas, resultados de provas ou mesmo somente dando uma passadinha na porta de um colégio mais perto da sua casa. Há um desleixo crescente da parte governamental, que vai desde a favelização do espaço físico das escolas até mesmo a degradação do sistema de ensino, por meio de políticas paternalistas de aprovação automática, como se a nossa sociedade estivesse pronta para absorver tal medida. O que se vê dentro dos colégios públicos é um reflexo do todo. Um reflexo do Brasil. A classe média, perdida em seus anseios, há muito deixou as salas geridas pelo governo e foi baixar nos particulares, que se reinventam, apostando em novas metodologias de ensino, mantendo a elite cada vez mais elitizada e afastada das classes mais baixas. Os pobres, perdidos em mp3 e demais tecnologias (apesar de muitas vezes nem terem o que comer), quando muito, sabem o nome do conjunto musical da moda.

Mas a idéia desse post é falar de prazer. Do imenso prazer de educar. A despeito de qualquer dificuldade, tanto em colégios públicos quanto em particulares, encontrar-se diante de um grupo de alunos ávidos por informação e poder ser o veículo que os conduzirá até ela é realmente algo indescritível. A arte de educar é algo que está acima de qualquer política governamental.

Sim, chamo de arte. Pois há arte até em uma equação matemática bem resolvida. Há o prazer envolvido. Quantas vezes não paramos para pensar que, mesmo não gostando de Quimica, houve uma vez um professor que fez com que nós olhássemos a distinta disciplina com olhares mais ternos? Ou, o que aconteceu com toda a paixão pela Literatura depois que aquele professor entrou na sala e mandou que decorássemos todos os autores parnasianos? O que diferencia um do outro? A arte. Educar é uma arte. É ser militante de uma causa quase perdida. É perceber que é possível fazer diferença. É contribuir para a formação de cidadãos. É ver que o Mundo pode ser melhor e perceber que pertencemos a ele. É sentir orgulho em fazer parte do crescimento das pessoas.

Por isso, digo também educar. Um professor não somente ensina, mas educa. Ajuda a "construir" seres humanos até quando está calado. Aliás, principalmente. O educador deve ser digno de estar sempre sendo servido em uma bandeja de prata como uma iguaria. Deve estar atento. Deve servir de exemplo.

Muitos me acusarão de ser utópico. Talvez seja. Talvez me decepcione. Mas quero acreditar que não. Porque se estão transformando a educação em simples ensino e a arte em mero ofício, isso não é comigo.

O vídeo de hoje é uma homenagem aos educadores. O filme pode ser de ficção, mas ilustra bem esse post. Quem tem alguma lembrança das décadas de 70 e 80, certamente se recordará de "Ao Mestre, com carinho" (To Sir, with love), filme em que Sidney Poitier luta, às vezes literalmente, pela arte de educar. A música é cantada por Lulu que também faz parte do elenco.

3 comentários:

Lavinia Fernandes disse...

Ah, Artur, ver que esse amor e essa crença no futuro ainda existem é muito bom.
Espero que vc seja um grande professor pra fazer mais gente admirar esse ofício, que hoje em dia é tão mal-tratado.
Sorte de quem estiver na sua sala.
Beijos

Anônimo disse...

Confesso que fiquei muito assustado com o colégio em que fizemos estágio e além de tudo saber que existem situações piores. Mas, isso não foi situação para desanimo, valeu a pena deparar com tal realidade e mais, valeu a pena para definir que realmente quero e desejo muito esse caminho que é um dos mais bonitos a ser seguido.

Geanglés B. de Moraes disse...

Um dos prazeres do verbo educar é o de estar sempre se reinventando. Há nove anos, quando pus meus pés numa sala de aula pela primeira vez assumindo uma pretenso controle, - haja visto os meus verborrágicos e matemáticos planejamentos sempre norteados pelo pensamento possessivo "a minha turma, o meu aluno, a minha voz, a minha acústica, o meu ponto de vista, a minha avaliação..." ; fui surpreendido com situações inusitadas. E são os imprevistos que nos faz quebrar a regra replay-de-formiga. Das muitas frases que jamais me esquecerei são as que foram ditas por Maurília - que isso fique registrado no meu sempre - uma orietadora pedagógica que me deu, além de boas palavras, mãos e colos simbólicos: "Jean, o verdadeiro sábio tem consciência da hora de estar ao rés-do-chão para entender o raso das existências (...) Jean, não é enchendo a cabeça de conceitos que vamos transformar a nossa História, é sujando as mãos mesmo!" Me emociono ao lembrar dessa mulher, e suas frases tão bem decantadas, que quase as ouço novamente ad litteram, fazendo estremecer as minhas tão imaturas certezas. O que realmente aprendi com Maurília é que educar é ser o outro. Não posso esquecer aqui de fazer uma referência a nossa querida Marilene e seu palco. Talvez ela não quisesse realmente dizer isso, mas toda vez que ela assumia seu palco imaginário, eu me lembrava das frases de Maurília: Educar é ser o outro. E é por isso que a gente se identifica com certas situações e certos professores. Por supostamente trajar os nossos anseios, as nossa alegrias e nossas expectativas... Mas, a vez verbalizada e encarnada numa menininha de 6 anos é a que mais me comove e me intriga até hoje: Eram 14:45 da tarde da primavera de 1999, quando uma menininha aproximou-se de mim, ela e sua boneca sem um olho e descabelada, e me disse sinceramente acompanhado de um cuspe lançado no meu rosto com toda a alma: "tio, eu te amo".
Fiquei um tanto sem ação. Mas aí retroverti: "Também te amo, minha sobrinha".
E desde aquele dia, a mocinha cheia de vontade dos belos cachos dourados, recheados de piolho, se tornou a melhor aluna, a mais atenta, a mais prestativa.
Educar não altruísmo ingênuo, mas deve haver uma boa dose de empatia. E crença.
Parabéns, Artur.